sábado, 28 de fevereiro de 2009

Tempo de Quaresma


“Convertei-vos e crede no Evangelho. Lembra-te que és pó e ao pó retornarás” São duas reflexões que nos são propostas quando o ministro sagrado, num gesto sacramental, impõe cinzas sobre nossas cabeças que se curvam penitentes.
Não vamos receber as cinzas como num ritual sem sentido. Conscientes do pecado do mundo, do nosso pecado também, que quer destruir o plano divino, caminhamos ao encontro da misericórdia de Deus que, pela Encarnação de seu Filho vem restaurar a Humanidade e a todo o Universo.
A pregação do profeta Joel que, neste primeiro dia da Quaresma, ecoa em toda a Igreja, nos convoca a conversão, a rasgar nosso coração na sua profundeza, ao arrependimento e a nos abrirmos à bondade divina, acreditando no Evangelho.
A penitência que fazemos, o jejum,a oração e a esmola não são obras externas. Nascidas no interior da nossa consciência, apresentamo-las ao Pai, sem trombetearmos pelas ruas e praças, mas na humildade do publicano que, do fundo do templo, batia no peito dizendo “Meu Deus, tem piedade mim que sou pecador” (Lc. 18,13).
E sendo uma penitência eclesial, ela não é exclusivamente pessoal; é a penitência de todos os que, batizados, cremos na redenção que, pela sua paixão e morte, o Filho de Deus traz a humanidade na confirmação de sua ressurreição.
A nossa falta de fidelidade ao Evangelho, ao reconhecimento do único Deus verdadeiro, à fraternidade entre os irmãos deve conduzir-nos à uma conversão sincera, aos valores que reconhecemos pela fé. “Completou-se o tempo e o Reino de Deus está perto. Convertei-vos e crede no Evangelho.” (Mc 1, 15)
Sintonizados com os nossos Pastores, procuramos descobrir onde estamos mais falhos na fé e na missão. No Brasil, neste ano, vamos meditar na solidariedade e segurança. A falta de fé e solidariedade conduziu-nos a uma angústia do medo. Fechamos nossas casas e nossas propriedades. Fechamo-nos a nós mesmos. Não reconhecemos o próximo. Queremos uma segurança pessoal, como se a técnica e os homens pudessem nô-la dar.
Esquecemo-nos do que nos pode garantir a tranqüilidade e a paz: a caridade, o amor. Enquanto continuarmos a considerar o homem como lobo do próprio homem, e passarmos ao largo da miséria como se nada tivéssemos a ver com ela, enquanto espoliarmos o próximo no liberalismo da política econômica e da política social, em vão procuraremos segurança.
A paz só nos advém da Justiça. Não da justiça farisaica, que foi condenada por Jesus: “Se a vossa justiça não for superior à dos escribas e fariseus, não entrareis no Reino dos céus.” (Mt. 5,20). A verdadeira Justiça é a santidade, que supera o “dente por dente e o olho por olho”, no amor, buscando com todas as forças a perfeição, como o Mestre conclui sua pregação: “Sede, portanto, perfeitos, como vosso Pai Celeste.” (Mt. 5, 39-48)
A reflexão sobre o tema da Campanha da Fraternidade deste ano, leva-nos a sair de nós mesmos, do nosso medo, da atribuição de culpa a outrem. Procuremos contribuir na construção do Reino, na solidariedade com nossos irmãos.
A nossa penitência não pode ser exterior, como pregava São Leão, Papa, no sermão 4 da Quaresma: “Não só na abstinência de alimento consiste nosso jejum: para frutuosamente subtrairmos o alimento ao corpo temos de arrancar a iniqüidade do nosso espírito.”Bento XVI na sua mensagem quaresmal, ressaltando as práticas penitenciais, sobretudo do jejum, insiste no mesmo tema: “A Quaresma seja portanto valorizada em cada família e em cada comunidade cristã para afastar tudo o que distrai o espírito e para intensificar o que alimenta a alma, abrindo-a ao amor de Deus e do próximo.”
A purificação da nossa vida de fé, refletindo numa caridade sem limites nos levará a pratica da justiça, a sermos perfeitos como o Pai, a quem, seguros e libertos, podemos confiar nossos dias:
“Aquele que habita à sombra do Altíssimo, descansará na proteção do Deus do Céu”. (Sl.91 (90).
Dom Eurico dos Santos Veloso

Fé Cristológica


Para a fé cristã só existe um Jesus Cristo. Nele encontramos um homem verdadeiro, nosso irmão (condição humana real) e, simultaneamente, encontramos Deus (condição divina real). Homem verdadeiro e Deus verdadeiro, confessa a igreja.A condição divina é vivida em 2 etapas, uma caracterizada pelo serviço, e outra pela glorificação.Etapa de serviço inicia-se no primeiro instante da vida de Jesus, na encarnação, e termina na morte de cruz. A etapa de glorificação começa com a Ressurreição de Jesus e perdura por toda a eternidade.E precisamente pq JC é dos nossos, da família humana, e, simultaneamente, de Deus, realmente divino, pode ser a ponte entre Deus e os seres humanos, isto é, pode ser Mediador.O Novo Testamento nunca separa o Jesus terreno, o Jesus da etapa de serviço, do Jesus Glorificado. Trata-se sempre do mesmo JC vivendo, isso sim, duas etapas diversas da sua existência. Entretanto, na história da igreja se têm desenvolvido orientações que acentuaram o valor da glorificação em detrimento da etapa de serviço enquanto que outras têm feito justamente o contrario. Isto foi conseqüência do influxo da visão dicotômica ou dualista do ser humano.Como é sabido, esta visão estabelece uma relação de exclusão entre alma e corpo de tsl maneira que a acentuação do valor da primeira implica na negação ou desvalorização do segundo. Ou, ao contrario, a valorização do corpo é feita em detrimento da alma. A mesma coisa acontece com a articulação entre duas dimensões do humano, tais como razão-afeto, individual-social etc. Esta visão repercute, e muito, no modo de se viver à existência cristã e tb sobre toda compreensão teológica (sobre esse tema pegar o livro do Rubio Unidade na Pluralidade e dar uma lida)Na cristologia, obviamente, a valorização do Cristo Glorificado tem levado a deixar muito em segundo plano a importância do caminho do serviço, que levou JC até o desfecho da cruz, ou, ao contrário, a valorização de Jesus terreno tem levado a descuidar ou deixar de lado o glorificado.Quando se valoriza unilateralmente o Cristo Glorificado:As celebrações litúrgicas tendem a ficar separadas do seguimento do caminho do serviço vivido por Jesus. Especialmente, a celebração da Eucaristia tende a acontecer separada da partilha e do amor-serviço (cf 1Cor 11,17ss).Sem levar em consideração a vida concreta de Jesus de Nazaré, pode-se muito facilmente interpretar o CRISTO de maneira ideológica, utilizando-o para justificar os mais variados interesses; quando se esquece a missão do servidor, desenvolve-se com facilidade um espiritualismo desencarnado. Não basta invocar o Espírito de JC. É necessário se perguntar se se trata do mesmo Espírito que impulsionou Jesus em sua missão Messias-servidor; esquecida a missão de servidor, é muito fácil utilizar o Cristo_Poder para justificar e sacralizar poderes deste mundo: políticos, econômicos e outros. O poder de JC pode ser utilizado também para justificar o exercício dominador da autoridade na Igreja. Na referencia exclusiva ao Cristo glorificado, é fácil esquecer que Jesus não se manteve neutro diante de seus conflitos de seu tempo e de sua sociedade. Ele fez claras opções pelos excluídos e enfrentou decididamente poderes opressores. Quando se deixa de lado o caminho do serviço vivido por Jesus, o Cristo glorificado, Amor e Reconciliação universais, pode ser invocado para evitar o compromisso diante das injustiças e dos conflitos atuais. Quando se valoriza unilateralmente o Jesus servidor, desenvolve-se uma tendência para reduzir Jesus a um simples revolucionário ou a um sábio, ficando, assim, empobrecida, radicalmente, a novidade de Jesus; esquece-se de que o anuncio do Ressuscitado contém algo novo em relação ao Jesus terreno. Esquece-se do valor salvífico da ressurreição de Jesus; o encontro com Jesus Terreno, servidor, acaba sendo estéril, pois é no Espírito do Ressuscitado que Jesus se torna presença viva e que o Evangelho pode ser, de fato, a Boa- Nova Libertadora (cf 2Cor 3,4-18)(Estudo feito a partir do livro O Encontro com Jesus Cristo Vivo- Pe. Alfonso Garcia Rubio)
(Prova de Cristologia- Marcia Calmon)