segunda-feira, 20 de abril de 2009

ADMINISTADOR INFIEL


Lição 1 : O teor da parábola

Jesus contou aos seus discípulos a estória de um homem
administrador de grande fazenda, em que se cultivavam cereais e
oliveiras. O respectivo proprietário vivia na cidade distante, de modo
que delegava amplos poderes ao seu ecônomo: tratava com os
colonos e clientes do seu patrão; alugava, vendia e comprava a seu
bel-prazer.
Um dia o procurador foi chamado ao escritório do seu patrão, que
lhe disse secamente: "Chegaram-me aos ouvidos péssimas
referências a teu respeito: tens esbanjado os meus bens. Presta
contas da tua administração, pois estás intimado a sair do cargo". Isto
se entende desde que se leve em conta que os orientais não
conheciam o controle regular das finanças.
Verifica-se que o administrador era, sim, desonesto, mas também
leviano; levava vida fácil e alegre, jogando com os bens de que
dispunha cada dia, sem mesmo se preocupar com o amanhã ou com
o seu próprio enriquecimento. Era o homem "não sábio", insensato,
que, ao ser demitido, se viu dolorosamente embaraçado: nada tinha
para garantir o seu futuro, pois simplesmente dilapidava os bens do
patrão. Levou, pois, um grande susto!
Pôs-se então a monologar consigo mesmo: não se desculpava,
mas reconhecia a sua culpa. Que faria doravante? Cavaria a terra?
Mendigaria? Nem uma coisa nem outra; o procurador, que fizera as
vezes de senhor de boa categoria social, tinha vergonha; ademais,
para cavar a terra, faltavam-lhe as forças e o hábito; quanto a
mendigar, parecia-lhe duplamente vergonhoso, depois de uma vida
abastada; com efeito, os judeus consideravam a mendicância como
castigo de Deus; ver Eclo 40,28s: "Filho, não vivas mendigando: é
melhor morrer do que mendigar. Ao homem que olha para a mesa
alheia, a vida não deve ser contada como vida".

De repente, o procurador descobriu um artifício astuto para se livrar das dificuldades. Chamaria cada um dos devedores do patrão e
diminuiria a sua dívida; quem aceitasse tão vantajosa negociata,
ficaria depois obrigado a receber em sua casa o administrador
demitido e carente de apoio. Assim o desonesto ecônomo aproveitou
os últimos dias de sua gestão não para devolver o que roubara, mas
para roubar mais ainda, só que, dessa vez, com proveito para si, com
previdência, com esperteza, ele que sempre roubara com leviandade
e futilidade. Compreende-se que os credores tenham aceito prontamente a "interessante" proposta do administrador, sem pensar
talvez nas obrigações que contraíam para com ele num futuro
próximo. Notemos, aliás, o estilo do diálogo do ecônomo com os
devedores: começa pela pergunta: "Quanto deves ao meu senhor?",
pergunta retórica, pois o administrador devia saber o montante; a
questão, porém, era válida para recordar ao devedor a importância
da sua dívida; reconheceria melhor o vulto do favor que lhe era prestado
pelo ecônomo astuto.Há quem explique de outro modo a negociata de
16,5-7: segundo o costume, tolerado na Palestina naquela época,
dizem, o administrador tinha o direito de conceder empréstimo com os
bens do seu senhor. E, como não era remunerado, ele se indenizava
aumentando, no recibo, a importância dos empréstimos. Assim na
hora do reembolso ficava com a diferença como se fosse seu
honorário ou seu juro. No caso da parábola, portanto, ele não havia
emprestado senão cinqüenta barris de óleo e oitenta medidas de trigo.
Colocando no recibo a quantia real, ele apenas estava se privando do
benefício que lhe tocaria segundo o costume vigente. Sua
desonestidade, portanto, não consistiria na redução de dívidas
devidas ao patrão, mas nas ações fraudulentas anteriores que
provocaram a sua demissão.

Este modo de entender o comportamento do administrador parece
um tanto artificial e arbitrário; pode-se perguntar: onde é que o texto
evangélico o fundamenta...? Mais lógica e óbvia parece-nos ser a
clássica interpretação: o administrador negociou desonestamente com
o dinheiro do patrão até o último dia da sua gestão.

O proprietário dispensou o procurador. Tomou então consciência
da fraude astuta; mas já era tarde para invalidá-la. Por isto, embora
sofresse o dissabor da lesão, ainda quis reconhecer a esperteza ou
habilidade do ladrão; não fora um ladrão bobo... "O senhor louvou o
administrador desonesto por ter agido com prudência" (v. 8a). "O
senhor", no caso, não é Jesus, mas o patrão lesado, que reconheceu
a fraude com espírito de humor.
Jesus, porém, acrescentou:"... pois os filhos deste século são
mais prudentes com a sua geração do que os filhos da luz" (v. 8b).
Que significa isto?

"Os filhos deste século" é expressão semita equivalente a "homens absorvidos pêlos interesses materiais ou temporais".

Estão em contraste com "os filhos da luz", sinônimo de "filhos de
Deus" (cf.1Jo 1,5), homens voltados para a prática do bem e da
honestidade. "Mais prudentes" quer dizer: "mais espertos, hábeis,
conscientes"; "com sua geração", isto é, com seus semelhantes. — As
palavras de Jesus exprimem um fato que até hoje se verifica: os maus
são mais finórios e sagazes na promoção dos seus interesses maus
ou meramente materiais do que os bons no serviço dos verdadeiros
valores e do próprio Deus. Já dizia Pio XII que o grande escândalo
dos nossos tempos é que os bons "estão cansados", ao passo que os
maus trabalham muito; pode parecer que a procura dos bens
materiais empolga mais os pecadores do que a procura dos bens
espirituais empolga os justos; os maus têm mais zelo pelo que é mau,
do que os bons pelo que é bom. Exemplo disto seria o administrador
desonesto que soube encontrar hábeis recursos para se manter
impune na fraude até o fim; seria para desejar que os bons o
imitassem na promoção do bem; "Aqueles correm em demanda de
uma coroa perecível; nós em demanda da imperecível", diz São Paulo
(1Cor 9,26). É bem de notar que Jesus não manda cometer o mal,
mas sim praticar o bem, todavia com o interesse e o empenho que os
maus aplicam para a promoção do mal. Lembremo-nos de que,
paralelamente, Jesus exorta os seus discípulos a ser hábeis como as
serpentes (cf. Mt 10,16).

Segundo alguns comentadores, a parábola termina no v.8. Cremos, porém, que o v.9 a integra como conclusão tirada por Jesus:
"E eu vos digo: fazei amigos com o dinheiro da iniqüidade, a fim de
que, no dia em que faltar, eles vos recebam nas tendas eternas". Esta
frase, aparentemente misteriosa, quer dizer o seguinte:

"Dinheiro da iniqüidade" é expressão semita que designa o
dinheiro como tal,... dinheiro que em si é algo de neutro (moralmente,
nem bom nem mau), mas que muitas vezes é iniqüamente utilizado
pelos homens; daí dizer-se "dinheiro iníquo" (1). Jesus faz do dinheiro
um símbolo dos bens ou talentos que cada um de nós possui (tempo,
saúde, dotes pessoais...); e exorta-nos a que, com esses bens,
pratiquemos obras boas (Vaçamos amigos") que nos mereçam o
ingresso na vida eterna ("tendas eternas")(2) . Sejamos tão zelosos
quanto os filhos das trevas, para realizar o bem enquanto é tempo, ou
enquanto a graça de Deus nos possibilita preparar nossa vida
definitiva; temos aqui um convite para acumular tesouros no céu, seja
por meio da esmola, seja mediante outras obras boas; ver Lc 12,33;
18,22.
(1)O texto grego diz 'mamona da iniqüidade*. Mamona vem da raiz aramaica mn (-aquilo em que se pode confiar, ou que ó seguro). Entra os judeus, significa posses ou propriedades, não raro em sentido pejorativo.
(2)"Habitar em tendas* é uma imagem que designa a mansão de Deus ou, sem metáfora, a bem-aventurança final; ver Mc 9,5; At 15,16; Ap 7,15; 21,3.


Os rabinos costumavam dizer que as boas obras são nossos intercessores: "Aquele que cumpre um mandamento, adquire para si um intercessor" (R Abn. 4,11).
"Donde vem que as esmolas e as obras de caridade sejam um grande intercessor? * (Tos. Pea 4,21).
Procuremos agora definir claramente os ensinamentos da parábola.

Lição 2: A interpretação da parábola
A parábola do administrador iníquo, que freqüentemente causa dificuldades aos intérpretes, é portadora de profundos ensinamentos.
Devemos observar, antes do mais, que é uma parábola a contraste..., parábola em que o Senhor propõe uma imagem negativa, hedionda, que, por contraste, significa algo de positivo e muito belo. Assemelha-se ao negativo de uma fotografia, que deve ser revelada, de tal modo que os respectivos traços pretos se tornarão brancos. Há outras parábolas deste gênero no Evangelho: em Lc 18,1-8 o juiz cínico é figura, por contraste, do Senhor Deus (que é o contrário do cinismo); em Lc 11,5-8 o amigo comodista é símbolo do próprio Deus (o Amigo que primeiro nos amou; cf. 1Jo 4,19); em Lc 11,11-13 o pai da terra, deficiente como é, simboliza o Pai do céu (que é perfeito). — No caso de Lc 18,1-9 Jesus propõe um homem que é fraudulento e leviano, fútil; um dia leva um susto, que o obriga a pensar sobre o sentido da vida; converte-se então, nos poucos dias que lhe restam, da futilidade e insensatez para a sabedoria e habilidade, sem porém deixar de ser desonesto. Com outras palavras: temos a história da fraudulência leviana que se converte em fraudulência atenta e sábia, em conseqüência de um susto que ainda lhe deixou poucos dias para se converter. Ora Jesus nos diz que essa estória ó imagem do que nós devemos fazer, nós que queremos ser filhos da luz e não filhos das trevas. Propensos à superficialidade e à rotina de vida, saibamos aproveitar os sustos que a Providência permite em nossa existência a fim de nos convertermos à sabedoria, sensatez e profundidade do coração.
Eis o esquema correspondente:
1) Filho deste mundo

Fraudulência insensata susto Fraudulência sensata
Prazo

2) Filho da Luz

Cristãos levianos susto cristãos mais sábios
Prazo

Mais precisamente formulemos as seguintes conclusões:






A parábola do administrador iníquo está na linha das do rico
proprietário de Lc 12,16-21, e do ricaço de Lc 16,19-31: ensina-nos a
olhar os bens deste mundo com sabedoria, isto é, a partir da
eternidade ou à luz do definitivo, a fim de não sermos surpreendidos
pela morte. Acrescenta, porém, às anteriores um elemento novo. Após
o susto ou a desinstalação, ainda há um prazo para a conversão e o
recomeço: Deus é paciente e misericordioso; antes de aplicar a justiça
definitiva, Ele concede oportunidades de emenda.
Assim a parábola vem a ser uma exortação à conversão (a sua tônica
está neste traço)..., conversão não tanto do pecado grave para a
virtude, mas sim da virtude levianamente praticada para a virtude
exercida com pleno fervor. O fervor heróico pode tomar aspectos
diversos no decorrer da história do Cristianismo. Eis a propósito, dos
Padres do deserto (século IV):
Certa vez um grupo de jovens monges foi procurar o abade Isquirião
no deserto para pedir-lhe orientação. Após narrar o seu modo de vida
austera (jejuns, vigílias, trabalho manual...), perguntaram-lhe: "Quanto
vale a nossa vida?" Respondeu o ancião: "Vale a metade daquilo que
nossos Pais fizeram". Muito surpresos, indagaram os jovens: "E
aqueles que virão depois de nós, quanto valerão?" Disse Isquirião: "
Farão a metade do que nós fazemos". Mais atônitos, ainda
perguntaram os jovens: "E aqueles que virão depois desses, que
farão?" Respondeu o abade: "Farão menos ainda do que os
anteriores, mas sobrevirá a eles uma grande tempestade, e os que

permanecerem fiéis naquele tempo, serão maiores do que nós e os
nossos pais".

Esta despretensiosa profecia vem-se cumprindo. Com efeito; é
cada vez mais atenuada em nossos dias a prática de ascese corporal
rigorosa (talvez em virtude da agitação da vida e do enfraquecimento
das saúdes), mas nem por isto os cristãos contemporâneos estão
condenados à mediocridade; a Providência lhes oferece a
oportunidade de ser constantemente sacudidos e solicitados para uma
vida sábia, consciente e plena mediante a tempestade de propostas
filosóficas dentro e fora da Igreja; levam a procurar "atenuar" ou
"humanizar* as exigências da fé; quem lhes resiste, mobiliza
constantemente suas energias espirituais e sacode a rotina...

2) A parábola nos ensina, como outras já estudadas, a aproveitar
os bens que temos, não necessariamente o dinheiro, mas outros dons
de Deus... enquanto é tempo, enquanto somos peregrinos à luz desta
vida terrestre. "Hoje, Oxalá ouçais a sua voz... Não endureçais vossos
corações,... como vossos pais, que me tentaram, embora tivessem
visto as minhas obras" (SI 94,7-9). Não sabemos quantas vezes ainda
diremos "Hoje...". Daí a premência de aproveitar o presente.
3) Saibamos tirar proveito também dos sustos e reveses desta vida ou... até mesmo do pecado. Deus pode permitir o pecado para
que despertemos da inconsciência para um comportamento mais
definido e coerente. Tudo é graça no plano de Deus; tudo pode servir
à nossa salvação.
4) O grande mal que pode acometer um cristão é a mediocridade de vida, é a acomodação sem dinamismo. Para Deus, só pode haver
uma resposta condigna: doar-se totalmente, sem regateios. Diz o
Senhor: "Conheço a tua conduta: não és frio nem quente. Oxalá
fosses frio ou quente! Mas, porque és morno, nem frio nem quente,
estou para te vomitar de minha boca" (Ap 3,15s). O desfibramento da
vida cristã, que por si é extremamente dinâmica, é que causa a
perplexidade e a indiferença do mundo ateu. "Vós sois o sal da
terra...", diz o Senhor (Mt 5,13).

quinta-feira, 9 de abril de 2009

LAVA-PÉS


Jesus lava os pés dos discípulosJo 13,1-15Faltava somente um dia para a Festa da Páscoa. Jesus sabia que tinha chegado a hora de deixar este mundo e ir para o Pai. Ele sempre havia amado os seus que estavam neste mundo e os amou até o fim. Jesus e os seus discípulos estavam jantando. O Diabo já havia posto na cabeça de Judas, filho de Simão Iscariotes, a idéia de trair Jesus. Jesus sabia que o Pai lhe tinha dado todo o poder. E sabia também que tinha vindo de Deus e ia para Deus. Então se levantou, tirou a sua capa, pegou uma toalha e amarrou na cintura. Em seguida pôs água numa bacia e começou a lavar os pés dos discípulos e a enxugá-los com a toalha. Quando chegou perto de Simão Pedro, este lhe perguntou: - Vai lavar os meus pés, Senhor? Jesus respondeu: - Agora você não entende o que estou fazendo, porém mais tarde vai entender! - O senhor nunca lavará os meus pés! - disse Pedro. - Se eu não lavar, você não será mais meu discípulo! - respondeu Jesus. - Então, Senhor, não lave somente os meus pés; lave também as minhas mãos e a minha cabeça! - pediu Simão Pedro. Aí Jesus disse: - Quem já tomou banho está completamente limpo e precisa lavar somente os pés. Vocês todos estão limpos, isto é, todos menos um. Jesus sabia quem era o traidor. Foi por isso que disse: "Todos menos um." Depois de lavar os pés dos seus discípulos, Jesus vestiu de novo a capa, sentou-se outra vez à mesa e perguntou: - Vocês entenderam o que eu fiz? Vocês me chamam de "Mestre" e de "Senhor" e têm razão, pois eu sou mesmo. Se eu, o Senhor e o Mestre, lavei os pés de vocês, então vocês devem lavar os pés uns dos outros. Pois eu dei o exemplo para que vocês façam o que eu fiz
LEITURA ORANTE Preparo-me para a Leitura Orante, rezando: Espírito de verdade, a ti consagro a mente e meus pensamentos: ilumina-me. Que eu conheça Jesus Mestre e compreenda o seu Evangelho. Ó Jesus Mestre, Verdade, Caminho e Vida, tem piedade de nós 1. Leitura (Verdade): O que diz o texto do dia? Leio atentamente o texto: Jo 13,1-15, e observo pessoas, palavras, relações, lugares. .Jesus lava os pés dos discípulos para dizer uma ´só coisa: amar é servir. Jesus tira o manto, no meio da refeição, e começa a lavar os pés dos discípulos. Tirar o manto significa abrir mão de todo privilégio ou status. Ele faz o que faziam os escravos. Num gesto de infinito amor. No final, diz: " Vocês entenderam o que eu fiz? Vocês me chamam de "Mestre" e de "Senhor" e têm razão, pois eu sou mesmo. Se eu, o Senhor e o Mestre, lavei os pés de vocês, então vocês devem lavar os pés uns dos outros." 2. Meditação (Caminho): O que o texto diz para mim, hoje? Hoje é o dia da instituição da Eucaristia, dia de ação de graças, como diz a própria palavra Eucaristia. E me pergunto: sou capaz de fazer como Jesus fez? Sou capaz de deixar o manto de meus privilégios mesmo quando tenho uma posição de chefia? Sou capaz de viver meu cargo, minha posição social como oportunidade de servir? Por amor? 3.Oração (Vida): O que o texto me leva a dizer a Deus? Hoje farei o possível de estar na comunidade em adoração a Jesus na Eucaristia. E, agora, faço, com a Família Paulina, esta oração, sugerida pelo bem-aventurado Alberione: Jesus, divino Mestre, Eu te louvo e agradeço pelo grande dom da Eucaristia. Teu amor te leva a morar conosco, E a renovar teu mistério pascal na missa, Onde te fazes nosso alimento. Que eu possa tomar dessa água viva que jorra do teu coração! Concede-me a graça de conhecer-te sempre mais, de encontrar-me contigo, todos os dias, neste Sacramento, de compreender e viver a missa, de me alimentar com o teu Corpo com devoção e fé. Amém. Ó Jesus Mestre, Verdade, Caminho e Vida, tem piedade de nós. 4.Contemplação (Vida e Missão): Qual meu novo olhar a partir da Palavra? "Somos chamados a encarnar o Evangelho no coração do mundo". Como vou vivê-lo na missão? Meu novo olhar é do amor que serve. Ó Jesus Mestre, Verdade, Caminho e Vida, tem piedade de nós.

domingo, 5 de abril de 2009

DOMINGO DE RAMOS


O Domingo de Ramos abre por excelência a Semana Santa. Relembramos e celebramos a entrada triunfal de Jesus Cristo em Jerusalém, poucos dias antes de sofrer a Paixão, Morte e Ressurreição. Este domingo é chamado assim porque o povo cortou ramos de árvores, ramagens e folhas de palmeiras para cobrir o chão onde Jesus passava montado num jumento. Com folhas de palmeiras nas mãos, o povo o aclamava “Rei dos Judeus”, “Hosana ao Filho de Davi”, “Salve o Messias”... E assim, Jesus entra triunfante em Jerusalém despertando nos sacerdotes e mestres da lei muita inveja, desconfiança, medo de perder o poder. Começa então uma trama para condenar Jesus à morte e morte de cruz.
O povo o aclama cheio de alegria e esperança, pois Jesus como o profeta de Nazaré da Galiléia, o Messias, o Libertador, certamente para eles, iria libertá-los da escravidão política e econômica imposta cruelmente pelos romanos naquela época e, religiosa que massacrava a todos com rigores excessivos e absurdos.
Mas, essa mesma multidão, poucos dias depois, manipulada pelas autoridades religiosas, o acusaria de impostor, de blasfemador, de falso messias. E incitada pelos sacerdotes e mestres da lei, exigiria de Pôncio Pilatos, governador romano da província, que o condenasse à morte.
Por isso, na celebração do Domingo de Ramos, proclamamos dois evangelhos: o primeiro, que narra a entrada festiva de Jesus em Jerusalém fortemente aclamado pelo povo; depois o Evangelho da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo, onde são relatados os acontecimentos do julgamento de Cristo. Julgamento injusto com testemunhas compradas e com o firme propósito de condená-lo à morte. Antes porém, da sua condenação, Jesus passa por humilhações, cusparadas, bofetadas, é chicoteado impiedosamente por chicotes romanos que produziam no supliciado, profundos cortes com grande perda de sangue. Só depois de tudo isso que, com palavras é impossível descrever o que Jesus passou por amor a nós, é que Ele foi condenado à morte, pregado numa cruz.
O Domingo de Ramos pode ser chamado também de “Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor”, nele, a liturgia nos relembra e nos convida a celebrar esses acontecimentos da vida de Jesus que se entregou ao Pai como Vítima Perfeita e sem mancha para nos salvar da escravidão do pecado e da morte. Crer nos acontecimentos da Paixão, Morte e Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo, é crer no mistério central da nossa fé, é crer na vida que vence a morte, é vencer o mal, é também ressuscitar com Cristo e, com Ele Vivo e Vitorioso viver eternamente. É proclamar, como nos diz São Paulo: ‘“Jesus Cristo é o Senhor”, para a glória de Deus Pai’ (Fl 2, 11).

domingo, 29 de março de 2009

FRUTOS DO ESPIRITO

1. Amor (agape) Para os gregos a palavra amor como conhecemos no português se desdobra em três tipos diferentes de amor. Assim, temos o amor do amigo, o filia. Há o amor da necessidade do outro, que é o eros. E há ainda um amor que é o mais elevado, chamado ágape.
É justamente esse amor que surge como fruto do Espírito. O amor ágape consiste no amor daquele que não busca a própria satisfação, mas se doa e até se sacrifica por outra pessoa, ou por uma tarefa. Seu mistério está no esquecimento de si, no interesse pela felicidade de outros. Ele não pede recompensas, elogios e reconhecimentos.
Esse é o amor da família de Deus, como eram aqueles primeiros cristãos, que eram um só coração e uma só alma. Assim, o amor ágape é aquele amor do interesse incondicional pela satisfação de outrem.
2. Alegria (chara) O fruto da alegria é aquela viva satisfação interior dada pelo Espírito. Ela que nos enche de entusiasmo por estarmos na presença de Deus. A palavra do original grego chara serve para designar uma pessoa ou um objeto que é a causa ou o objeto da alegria. Essa alegria que faz com que as cruzes que carregamos se tornem leves. Ela nos tira do medo que nos impede de ir ao encontro das pessoas, nos tira do nosso respeito exagerado ao outro e nos conduz à celebrar nossa vida no ambiente acolhedor da família de Deus.
3. Paz A palavra paz pode indicar um estado interior de harmonia, de libertação das ansiedades. No entanto, para o contexto específico da Carta aos Gálatas ela consiste na nossa reconciliação com Deus pela libertação dos pecados. O fruto da paz indica que estamos aproximados de Deus, que não permanecemos como inimigos de Deus, devedores pelos nossos erros. Mas agora, como homens e mulheres lavados no sangue de Jesus, o Espírito nos faz chamar nosso Pai dos Céus de “Abba Pai” (papaizinho) e entender que Ele nos chama agora de filhos muito amados.
4. Longanimidade Uma pessoa longânime é aquela pessoa que tem como qualidade a capacidade de suportar uma situação de sofrimento. Pode ser ainda a virtude de suportar com firmeza as contrariedades que as pessoas que amamos nos causam, a fim de conduzí-las ao bem. Assim pelo conhecimento da fraqueza da pessoa o conflito é evitado. Nesse sentido a longanimidade se relaciona intrinsecamente com a mansidão, que é o agir oportuno, acertado, de quem sabe esperar o momento certo para resolver as coisas.
São Paulo ensina ao falar dos dons que ela é a quietude da alma em meio a situações desfavoráveis, como provocações ou desentendimentos. É muito próprio da pessoa longânime não reagir com irritação, reclamação ou revide na hora dos problemas.
5. Benignidade (chrêstotês)
Consiste na atitude de gentileza ou docilidade no trato com as pessoas. Se opõe à severidade e à dureza. Se relaciona a uma postura de alguém que costuma ser prestativo, ou seja, que possui como hábito ajudar as pessoas ou costumeiramente procurar o melhor para os outros.
É a disposição daquele que se sensibiliza com a necessidade dos outros. Assim, o benigno está pronto a ajudar e se torna favorável à realização de trabalhos que beneficiem às demais pessoas. A benignidade se opõe portanto ao desprezo, à indiferença e à fúria.

6. Bondade
A característica principal desse fruto é a disposição favorável, ou na inclinação habitual de sempre darmos ou repartirmos o que possuímos com outras pessoas. Consiste também em habitualmente ser generoso ou bondoso com alguém. É sempre ligado a beneficiar gratuitamente outras pessoas, fazendo-lhes o bem. A palavra agatôsunê é essencialmente voltada para a prática, para o auxílio a outras pessoas. Ela não se associa exclusivamente a sentimentos mas à realização de tarefas para as quais somos impulsionados.
7. Fidelidade (pistis) Característica ou atributo daquele que é fiel, ou seja, daquele que confia em uma pessoa. Como um fruto do Espírito é aquela confiança em Jesus Cristo, no socorro de sua Palavra, na sua proximidade amiga. A fé em Jesus nos leva à decisão de crermos firmemente naquilo que nos ensina a Igreja como conteúdo da doutrina sagrada. Quando vivemos esse fruto abandonamos questionamentos e dúvidas desnecessárias e nos fiamos ousadamente no que ensina a Palavra de Deus. Esse fruto nos dá firmeza de ânimo face às críticas que recebemos dos infiéis ou dos vacilantes. Por ele resistimos e damos testemunhos do amor que temos por Jesus, sem nos importar com o julgamento que fazem sobre nós.
8. Mansidão (prautês) Postura de gentileza no relacionamento com as pessoas. Também corresponde àquela docilidade própria do amigo. Mas docilidade entendida aqui como força que nos possibilita acolher as fraquezas daqueles que amamos. Essa força vem do reconhecimento de nossas próprias forças e fraquezas, ou seja, de nossa humildade (consciência do que se é). Esse fruto do Espírito se opõe à aspereza ou aridez na maneira de tratar os irmãos.
Diz respeito ao âmbito das paixões. É a capacidade de ter auto-controle, de ter domínio sobre o impulsos do desejos, especialmente os relativos à sensualidade. É a manifestação de controle exercido pelo Espírito sobre os desejos e paixões, particularmente sobre os apetites sensuais.

sábado, 21 de março de 2009

DIREITO AO ABORTO



Embora contrário ao aborto, admito a sua descriminalização em certos casos, como o de estupro, e não apoio a postura do arcebispo de Olinda e Recife ao exigir de uma criança de 9 anos assumir uma gravidez indesejada sob grave risco à sua sobrevivência física (pois a psíquica está lesada) e ainda excomungar os que a ajudaram a interrompê-la.
Ao longo da história, a Igreja Católica nunca chegou a uma posição unânime e definitiva quanto ao aborto. Oscilou entre condená-lo radicalmente ou admiti-lo em certas fases da gravidez. Atrás dessa diferença de opiniões situa-se a discussão sobre qual o momento em que o feto pode ser considerado ser humano. Até hoje, nem a ciência nem a teologia tem a resposta exata. A questão permanece em aberto.
Santo Agostinho (sec. IV) admite que só a partir de 40 dias após a fecundação se pode falar em pessoa. Santo Tomás de Aquino (séc. XIII) reafirma não reconhecer como humano o embrião que ainda não completou 40 dias, quando então lhe é infundida a "alma racional".
Esta posição virou doutrina oficial da Igreja a partir do Concílio de Trento (séc. XVI). Mas foi contestada por teólogos que, baseados na autoridade de Tertuliano (séc. III) e de santo Alberto Magno (séc. XIII), defendem a hominização imediata, ou seja, desde a fecundação trata-se de um ser humano em processo. Esta tese foi incorporada pela encíclica Apostolica Sedis (1869), na qual o papa Pio IX condena toda e qualquer interrupção voluntária da gravidez.
No século XX, introduz-se a discussão entre aborto direto e indireto. Roma passa a admitir o aborto indireto em caso de gravidez tubária ou câncer no útero. Mas não admite o aborto direto nem mesmo em caso de estupro.
Bernhard Haering, renomado moralista católico, admite o aborto quando se trata de preservar o útero para futuras gestações ou se o dano moral e psicológico causado pelo estupro impossibilita aceitar a gravidez. É o que a teologia moral denomina ignorância invencível. A Igreja não tem o direito de exigir de seus fiéis atitudes heróicas.
Roma é contra o aborto por considerá-lo supressão voluntária de uma vida humana. Princípio que nem sempre a Igreja aplicou com igual rigor a outras esferas, pois defende o direito de países adotarem a pena de morte, a legitimidade da "guerra justa" e a revolução popular em caso de tirania prolongada e inamovível por outros meios (Populorum Progresio).
Embora a Igreja defenda a sacralidade da vida do embrião em potência, a partir da fecundação, ela jamais comparou o aborto ao crime de infanticídio e nem prescreve rituais fúnebres ou batismo in extremis para os fetos abortados…
Para a genética, o feto é humano a partir da segmentação. Para a ginecologia-obstetrícia, desde a nidação. Para a neurofisiologia, só quando se forma o cérebro. E para a psicosociologia, quando há relacionamento personalizado. Em suma, carece a ciência de consenso quanto ao início da vida humana.
Partilho a opinião de que, desde a fecundação, já há vida com destino humano e, portanto, histórico. Sob a ótica cristã, a dignidade de um ser não deriva daquilo que ele é e sim do que pode vir a ser. Por isso, o cristianismo defende os direitos inalienáveis dos que se situam no último degrau da escala humana e social.
O debate sobre se o ser embrionário merece ou não reconhecimento de sua dignidade, não deve induzir ao moralismo intolerante, que ignora o drama de mulheres que optam pelo aborto por razões que não são de mero egoísmo ou conveniência social, como é o caso da menina do Recife.
Se os moralistas fossem sinceramente contra o aborto, lutariam para que não se tornasse necessário e todos pudessem nascer em condições sociais seguras. Ora, o mais cômodo é exigir que se mantenha a penalização do aborto. Mas como fica a penalização do latifúndio improdutivo e de tantas causas que, no Brasil, levam à morte, por ano, de cerca de 21 entre cada 1.000 crianças que ainda não completaram doze meses de vida?
"No plano dos princípios - declarou o bispo Duchène, então presidente da Comissão Espiscopal Francesa para a Família - lembro que todo aborto é a supressão de um ser humano. Não podemos esquecê-lo. Não quero, porém, substituir-me aos médicos que refletiram demoradamente no assunto em sua alma e consciência e que, confrontados com uma desgraça aparentemente sem remédio, tentam aliviá-la da melhor maneira, com o risco de se enganar" (La Croix, 31/3/79).
O caso do Recife exige uma profunda análise quanto aos direitos do embrião e da gestante, a severa punição de estupros e violência sexual no seio da família, e dos casos de pedofilia no interior da Igreja e, sobretudo, como prescrever medidas concretas que socialmente venham a tornar o aborto desnecessário.
FREI BETTO
[Autor, em parceria com L.F. Veríssimo e outros, de "O desafio ético" (Garamond), entre outros livros].